Poderia ser alegria, Poderia ser saudade,
Poderia ser agonia, Poderia ser solidão,
O que meus olhos lêem? O que meu coração interpreta?
Não sei o que sinto, nem que verbo usar.
Por isso tenho grande medo, advérbio e adjetivo
que conheço bem o emprego.
Medo do verbo falar, Medo do verbo sentir,
Medo do verbo expressar
Quisera eu parafrasear a dor, assim choraria,
Mas não a sinto em meu texto.
Quisera eu parafrasear o amor, assim sonharia.
Mas não o sinto em meu texto.
Quisera eu sentir nada e ser oração sem sujeito,
assim livre estaria.
Mas algo sinto, sou sujeito oculto, oculto em meu texto.
Quisera eu analisar sintaticamente os termos que regem esse texto-minha-vida no sujeito que sou eu,
Mas sinto muito, Não consigo,
O encadeamento de idéias e ambigüidade
dificulta minha interpretação.
Na verdade a Palavra que te falo agora
é predicado de minha mente mortal,
Ou melhor, é ainda mais um vocativo
que evoca um sentimento desonra,
Pois que honra tem um poema
que não consegue descrever o que sente?
Um Poema que tem medo das Palavras.
Um Domador que tem medo de Leão.
Um Alpinista que tem medo de Altura.
Assim sou eu, pois nem se quer sei o que sinto agora.
Qual minha contextualização?
Meu desenvolvimento, clímax e conclusão?
Que verbo empregar nesse meu novo sentir?
Como escrevo esse novo sentimento
se tenho medo de interpretá-lo?
A Palavra que te falo agora
é ponto e vírgula que me separa,
Desse bem ou mal que sinto.
A Palavra que te falo agora são dois parênteses,
Que me prendem ao casulo enigmático
do saber interpretar-me.
Será que ao me libertar desse casulo tornar-me-ei mariposa-voadora, oração principal?
Ou será que continuarei
lesma-rastejante, oração subordinada?
A Palavra que te falo agora é verbo intransitivo,
Pois ela por si só, sem complemento
já diz meu maior segredo.
A Palavra que te falo agora, na verdade sou eu mesmo,
Vivo em carne e osso nessas entrelinhas,
sem metáforas ou metonímias.
Mas ainda sim esse medo me adjetiva.
Pois a Palavra, que sou eu,
me aglutina com outras me deixando composto,
Juntando toda minha complexidade
e não se expressando concisamente.
Como interpretar esse texto-minha-vida
e encontrar sujeito oculto que sou eu?
Novamente pergunto...
Qual substantivo usar para adjetivar
essa palavra que sou eu?
Poderia ser alegria, Poderia ser saudade,
Poderia ser agonia, Poderia ser solidão,
Não sei a regência nominal dessa Palavra, que sou eu...
Por isso, tenho grande medo.
Medo das palavras,
Palavras que juntas me formam em texto vivo e pensante,
mas texto incoerente.
Davson Sobral
Brilhante Davson. Isso é o que eu quero ler todos os dias!
ResponderExcluirCOMENTÁRIO DE ELISEU:
ResponderExcluirEsse texto é um dos meus preferidos. Adoro o modo como o narrador brinca com a semântica no texto e como ele relaciona os sentidos, emprego e a classe de cada palavra. Entretanto, o que mais amo nele é a sua proposta provavelmente despretensiosa porém perfeita, na minha opinião, de revelar, de despir a crise existencial de qualquer indivíduo que pratique o ato raro da introspecção (coisa quase extinta da humanidade), que é a sede humana por auto conhecimento. Explique-me alguém, por favor! A falta de explicação do que eu sou ou de quem sou eu, a lacuna chamada dúvida que cria um buraco negro imenso o qual propósta nenhuma nesse mundo pode preencher, exceto através de um mecanismo conhecido por fé, que na integra nos impele apenas a descançar nessa incompreeção sem explicar coisa alguma.
é assim que me vejo quando leio esse texto e não tenho a pretensão de analisar o autor ou suas emoções ao escrevê-lo, mesmo porque ao ler o texto, estou lendo a mim mesmo.